segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,


Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,

Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,

Pergunto a mim próprio devagar

Porque sequer atribuo eu

Beleza às coisas.

Uma flor acaso tem beleza?

Tem beleza acaso um fruto?

Não: têm cor e forma

E existência apenas.

A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe

Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.

Não significa nada.

Então porque digo eu das coisas: são belas?

Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,

Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homens

Perante as coisas,

Perante as coisas que simplesmente existem.

Que difícil ser próprio e não ver senão o visível!


In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa.


1 Comentário:

Epoca dos fogos disse...

Os monstros de repente querem parecer ter sentimentos. Perderam o sentido de humor e até querem parecer humanos, sem memória são florzinhas inofensivas. Há poemas que ensinam os homens a desconfiar daqueles que falam do belo, podemos estar na presença de incendiários.

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