terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Os pobres que paguem a crise?

"O governo anunciou que vai alargar por mais um ano o programa de prevenção de execuções para evitar que as famílias percam as suas casas". Diria que isto acontece em que parte do mundo? Na Europa? E aqui, em Portugal? Pois está enganado. É nos Estados Unidos.

"O governo anunciou que vai alargar por mais um ano o programa de prevenção de execuções para evitar que as famílias percam as suas casas". Diria que isto acontece em que parte do mundo? Na Europa? E aqui, em Portugal? Pois está enganado. É nos Estados Unidos.

Em Portugal foram 6900 as casas entregues aos bancos por falta de pagamento dos empréstimos, um aumento de 17% em 2011. Quase metade dos casos aconteceram nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, com especial relevo para as zonas que funcionam como dormitórios.

O número de famílias que se declararam insolventes elevaram-se a 2.400 só no primeiro semestre do ano passado. O retrato numérico esconde histórias de autêntico terror e que nunca imaginaríamos ouvir há menos de seis meses. Idosos, que garantiram empréstimos aos filhos que não os pagaram, vêem entrar pelas suas casas os homens da execução que os deixam com um colchão e um casquilho para colocarem uma lâmpada, num total e absoluto desrespeito pela lei. Ou famílias que ficam sem a casa mas que têm de continuar a pagar o empréstimo.

Há umas semanas, num das análises à crise, o director da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, José Ferreira Machado, fez uma constatação muito interessante. Nos Estados Unidos, a sociedade e o governo responsabilizaram os bancos, ou seja, os credores, pela sua crise da dívida. Na Europa culpam-se os devedores. Atitudes que estão a determinar medidas e políticas completamente diferentes nos dois lados do Atlântico.

O resultado desta atitude, que insulta o liberalismo, é uma Europa que desprotege os mais frágeis. Os gregos estão na miséria? Os portugueses caminham para a miséria? Pouco parece interessar aos líderes europeus, muito menos a Angela Merkel, mais preocupada em ganhar eleições na sua terra. Afinal os gregos, os portugueses, os irlandeses, os italianos, os espanhóis não votam na Alemanha.

Portugal é obrigado a jogar este jogo. Mas, na liberdade que tem, devia fazer a diferença. O ajustamento, como está desenhado, dita um mergulho recessivo na economia. Mas o programa de ajustamento dá ao governo de Pedro Passos Coelho margem para distribuir os custos desse reajustamento.

Até agora, a redução dos défices públicos e externo têm sido pagos pelo português comum, que depende do seu salário para viver ou que tem uma pequena empresa. É a eles que foi enviada a factura do aumento dos impostos, do corte dos subsídios, do pagamento da saúde, da subida da electricidade, do agravamento nos transportes públicos. O resultado tem sido a perda do emprego, a perda da casa e o desespero para muitas famílias.

A culpa é da troika? Claro que não. O retrato dos números do desemprego, das execuções e das insolvências devia fazer ver ao Governo como é urgente adoptar medidas que também são exigidas pela troika, como a redução da factura das parcerias público-privadas e dos subsídios da electricidade. Há no programa de ajustamento medidas que tardam a chegar e que reduzem a factura da crise que os mais frágeis estão a pagar.

"Os pobres têm de se sacrificar porque os ricos têm muitas despesas", diz ironicamente quem quer desdramatizar o desespero das conversas sobre a crise. Esperemos que este não seja o catecismo reinante. Os pobres que paguem a crise não é nenhum princípio liberal. É imoral.

Por Helena Garrido, no "Jornal de Negócios"

1 Comentário:

olho vivo disse...

Recortes…

O PSD depois da derrota eleitoral de 27/9/2009, acabou por escolher um novo líder ultra-liberal com algumas características inéditas na política portuguesa. Passos Coelho é um produto das "juventudes partidárias", que durante muitos anos o sustentou. Um dia quando resolveu estudar foi para uma universidade privada (Univ. Lusíada), e depois arranjaram-lhe um emprego em empresas propriedade de antigos dirigentes do PSD. Ao longo da sua militância partidária nunca teve uma ideia política própria, mas apenas algumas "atitudes" que os politólogos portugueses interpretam como ideias em gestão.
Passos Coelho, após ser eleito líder partidário (26/3/2010), continuou a recusar qualquer entendimento com o governo do PS (minoritário). A novidade na sua actuação foi o facto de submeter o governo do PS, a uma constante chantagem ameaçando derrubá-lo a qualquer momento. Uma acção conjugada com Cavaco Silva (Presidente da República), e apoiada pelo PCP, BE e do CDS-PP.
O PSD ao longo dos últimos anos afirmou que possuía os quadros mais bem preparados para governar Portugal, acusando o anterior governo de incompetência. A verdade é que após ter ganho as eleições e passados 6 meses revelou-se que não tinha afinal não tinha ninguém. Os principais ministros foram recrutados à última hora, nomeadamente no Canadá...

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